Dodge recebe membros da Lava Jato para apoiar operação em meio a crise
Em meio à divulgação de mensagens trocadas entre procuradores da Lava Jato, que colocaram a operação sob escrutínio, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recebeu na tarde desta terça-feira (16) oito membros da força-tarefa de Curitiba, entre eles Deltan Dallagnol, para afirmar o apoio da PGR ao trabalho do grupo.
Não houve declarações à imprensa após a reunião, que durou cerca de três horas e foi realizada na sede da Procuradoria-Geral, em Brasília. Segundo o órgão, o encontro, marcado a convite de Dodge, serviu para ela demonstrar apoio institucional e administrativo à Operação Lava Jato.
A Corregedoria da instituição também informou aos procuradores que arquivou todos os pedidos de investigação da conduta deles. Ainda segundo a PGR, o Ministério Público Federal está empenhado em preservar a higidez das investigações e vai manter a estrutura da Lava Jato e a prioridade do combate à corrupção.
"O apoio institucional, financeiro e de pessoal ao combate à corrupção e ao crime organizado feito pela força-tarefa Lava Jato continuará, para que o patrimônio público seja preservado e a honestidade dos administradores prevaleça, pois o contraditório e a ampla defesa têm sido usados nas ações judiciais para assegurar que o trabalho esteja apto a produzir efeitos legais válidos", disse Dodge, segundo nota publicada após a reunião.
Inicialmente, o órgão não havia informado o que fora falado na reunião sobre as mensagens trocadas entre os procuradores pelo aplicativo Telegram. O teor das conversas vem sendo publicado pelo site The Intercept Brasil e outros veículos, incluindo a Folha de S.Paulo. As primeiras vieram à tona em 9 de junho, em reportagem do Intercept.
Ainda segundo a nota da PGR, o corregedor-geral do Ministério Público Federal, Oswaldo José Barbosa Silva, disse na reunião que nunca houve "uma tentativa tão agressiva de minimizar o Ministério Público". Participaram da reunião os procuradores de Curitiba Deltan Dallagnol, Julio Noronha, Roberson Pozzobon, Laura Tessler, Antônio Augusto Teixeira Diniz, Isabel Groba Vieira, Antônio Carlos Welter e Paulo Roberto Galvão.
Pela PGR participaram, além de Dodge, os procuradores Raquel Branquinho, Alexandre Camanho, Eliana Torelly, Mara Elisa e Oswaldo José Barbosa Silva. De acordo com a nota da PGR, Dallagnol disse na reunião que está tranquilo. "Temos tranquilidade em relação ao que fizemos. Não ultrapassamos a linha ética. Somos um grupo grande que sempre decidiu em conjunto. Sucessivas pessoas passaram por lá, a atuação era técnica e legítima", disse.
Dodge vinha sendo cobrada por membros do Ministério Público Federal que esperavam dela uma defesa mais enfática da Lava Jato.Seu mandato à frente da Procuradoria-Geral termina em setembro. Ela se pôs à disposição para ser reconduzida ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro, apesar de não ter disputado a eleição interna realizada pela categoria no mês passado.
A eleição resultou na elaboração de uma lista tríplice, com os três nomes mais votados, entregue a Bolsonaro --nesta ordem, Mário Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul. O presidente não se comprometeu a seguir a lista, diferentemente do que fizeram seus antecessores. O instrumento não tem previsão legal, mas tem sido seguido por todos os presidentes desde 2003.
Na última sexta-feira (12), o procurador José Alfredo de Paula Silva, coordenador do grupo de trabalho da Lava Jato na Procuradoria-Geral, pediu demissão do cargo. Em ofício, Silva justificou a decisão por questões pessoais. A informação foi antecipada pelo jornal O Globo nesta terça-feira (16). O jornal atribuiu a decisão de Silva a um descontentamento com a suposta lentidão de Dodge na análise de casos importantes, como a delação do empreiteiro Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS.
Pinheiro citou em sua delação membros do Legislativo e do Judiciário. Desde janeiro, o acordo está parado no gabinete de Dodge para análise e ainda não foi enviado ao Supremo Tribunal Federal para ser homologado. No último domingo (14), reportagem da Folha de S.Paulo e do Intercept mostrou mensagens de Deltan que sugerem um plano de negócios com palestras e eventos para lucrar com a fama conquistada na Lava Jato.
Em uma conversa com sua mulher, Deltan comentou a iniciativa. "Vamos organizar congressos e eventos e lucrar, ok? É um bom jeito de aproveitar nosso networking e visibilidade", escreveu. Mensagens anteriores que já foram noticiadas mostram, entre outras coisas, o ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, sugerindo a inversão da ordem de operações, antecipando uma decisão judicial e orientando ".Deltan a incluir numa denúncia uma prova contra um réu.
Tanto Moro como os procuradores de Curitiba têm afirmado que não reconhecem a autenticidade das mensagens, mas não têm negado sua existência. Eles enfatizam que a provável origem dos vazamentos tenha sido um crime cibernético, o que está em apuração.
por Reynaldo Turollo Jr. | Folhapress