Diante do comportamento inconsequente em aglomerações, era esperado que, em algum momento, o presidente Jair Bolsonaro fosse diagnosticado com Covid-19. O anúncio foi um resumo simbólico do governo: sem preparo algum e sem medir os impactos da situação. Bolsonaro fez uma coletiva restrita a veículos amigos e, mesmo usando máscaras, expôs os presentes ao risco de contrair o novo coronavírus. Nada fora do protocolo.
O teste positivo do presidente o coloca como garoto propaganda perfeito para a hidroxicloroquina. Como não há preocupação com evidências científicas para o uso do medicamento, a simples declaração de que Bolsonaro foi beneficiado pela substância vai justificar a corrida e a pressão para que o remédio seja prescrito pelos médicos. É sintomático que ele seja tratado pelo que pode ser um efeito placebo.
Infelizmente, o presidente se esforçou em negar, ao longo dos últimos meses, a gravidade da crise do novo coronavírus. A loteria da vida pode colocar a Covid-19 como uma “gripezinha” no caso de Bolsonaro e isso torna o potencial dessa contaminação ainda mais assustador. Se antes, com as sucessivas negativas da doença, o impacto da fala dele sobre a população era enorme, o estrago da versão “super-homem”, com uso da hidroxicloroquina, pode render efeitos ruins ainda maiores. Como sabemos, o chefe do Executivo nunca foi muito dado a medir os próprios atos.
Em um ambiente em que naturalizamos o absurdo, infelizmente não é surreal ver a quantidade de dúvidas levantadas após a afirmação de que o presidente contraiu o vírus. Bolsonaro criou um ambiente de incerteza e de descredibilização da presidência que, infelizmente, resultou nesse caldo de divisionismo político. É uma pena, porém é uma consequência direta da forma como ele lida com quem pensa diferente dele.
Após o diagnóstico, as lideranças políticas sensatas pediram que a confirmação da doença amenize a forma pouco responsável com que Bolsonaro lida com o coronavírus. Não dá para criar expectativa, até mesmo pela maneira como o presidente escolheu divulgar o resultado do exame. Bolsonaro e a hidroxicloroquina se merecem. Ambos podem ter efeito positivo ou negativo diante de uma doença. Pena que, a depender da dose, ambos podem matar. No caso da Covid-19, já foram mais de 66 mil pessoas que perderam a vida no Brasil nessa conta.
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por Fernando Duarte